sábado, 13 de fevereiro de 2016

Cadê o brinquedo?


              É esta a pergunta que eu tenho vontade de fazer sempre que vejo os pais com seus filhos fora de casa – e em casa também.   A antiga sacola cheia de brinquedos que antes carregávamos ao sair com as crianças, ou o antigo quarto de brinquedos foram substituídos por algo que ocupa muito menos espaço e que dá muito menos “trabalho”:  IPad e/ou telefones celulares.   Ocupa menos espaço físico, dá menos trabalho, porque hipnotiza a criança, que não consegue tirar os olhos do “brinquedo” do século XXI. 
              Fico muito frustrada ao dar-me conta de que, em uma época em que deveríamos ter expandido nosso conhecimento, especialmente no que se refere ao desenvolvimento infantil, ao invés de adicionar (e não substituir) a tecnologia ao mundo de nossos filhos, contribuindo para a abertura e desenvolvimento de novas habilidades, temos serzinhos inocentes sendo manipulados, dominados e consumidos por uma tecnologia que somente limita, vicia e tolhe todas as outras possibilidades.
              Citando Albert Einstein, “Brincar é a mais elevada forma de pesquisa”.  E por “brincar”, nós, educadores, nos referimos a brinquedos, brincadeiras e jogos de manipulação, construção, exploração, imaginação, fantasia, estratégia, desafio, movimento etc.  Evidentemente, a diversão está implícita.  É disso que nossas crianças precisam!  Meios para pesquisarem o mundo à sua volta, para aprenderem a se relacionar e a criarem o seu mundo, através dos seus próprios olhos e não somente dos nossos.
              É assim que acontece:  observação e aprendizagem do que está estabelecido, confronto com o que já se sabe, experimentação, manipulação, tentativa e observação de resultados, criação dos próprios conceitos.  É esse o ciclo.  O brinquedo que brinca sozinho não possibilita esse processo científico.  Possibilita outras...
              Além das explicações técnicas, tenho a minha própria, baseada em pura observação:  a criança que brinca somente com eletrônicos, por exemplo, fica praticamente hipnotizada, não interage socialmente.  Fica alheia ao mundo à sua volta.  Na verdade, isso é um problema que atinge a todos nós, não somente crianças.  Porém, com crianças isso é muito mais preocupante, pelos motivos já mencionados.
              A criança que lê livros de papel, brinca com cubos, quebra-cabeças, joga bola, pula elástico, joga bolinhas de gude, joga ludo, canta e dança com o microfone, monta castelos de areia e usa uma infinidade de brinquedos e brincadeiras, tem amigos, se torna uma criança completa, sociável, e que desenvolve todas as inteligências múltiplas!  Foco, atenção, análise, escolha de estratégia, diversão e relacionamento, são habilidades fundamentais para o bom desenvolvimento do ser humano.  A tecnologia também faz parte desse universo, evidentemente.  Só precisamos evitar os extremos. 
O mesmo se aplica a uma pseudonecessidade de entreter as crianças o tempo todo.  Não!  Eles não precisam de alguém brincando com eles o tempo todo.  Precisam de tempo para desafiarem a eles próprios, precisam de tempo de concentração e de dar asas à imaginação.  Hoje, com monitores nas festas e nas escolas, babás, as crianças ficaram dependentes demais.  Mais uma vez, sem extremismos.  Há os momentos importantes de terem companhia, mas há também os momentos importantes de exploração individual. 
              Desse modo, lanço a campanha “de volta à sacola de brinquedos” quando saímos com nossos filhos!  Aquela sacola imensa que até bem pouco tempo era levada aonde quer que as crianças fossem, para terem com o que brincar...  de volta ao “quarto de brinquedos”, de volta à brincadeira sadia, sem extremismos.  A “babá eletrônica” pode ser utilizada, mas com sabedoria. 
              Para ler mais sobre o assunto:  https://rubemalvesdois.wordpress.com/2012/10/26/1545/


segunda-feira, 28 de julho de 2014

"Devo educar meus filhos para serem éticos?"


Desta vez faço minhas as palavras de Gustavo Ioschpe.  O texto abaixo veio ao encontro de tudo em que acredito.  Cada vez menos me conformo em viver em uma sociedade que mente descaradamente e utiliza a “Lei de Gerson” em seu dia-a-dia, sem se importar verdadeiramente com o próximo, a não ser que seja para levar sua própria vantagem.  Giselle Fernandes.

Com a palavra, Gustavo Ioschpe:

Educação
Gustavo Ioschpe

HANNAH ARENDT -  “Os maiores males não se devem àquele que tem de confrontar-se consigo mesmo. Os maiores malfeitores são aqueles que não se lembram porque nunca pensaram na questão”      (Getty Images)
Quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, saía de casa para a escola numa manhã fria do inverno gaúcho. Chegando à portaria, meu pai interfonou, perguntando se eu estava levando um agasalho. Disse que sim. Ele me perguntou qual. “O moletom amarelo, da Zugos”, respondi. Era mentira. Não estava levando agasalho nenhum, mas estava com pressa, não queria me atrasar.
Voltei do colégio e fui ao armário procurar o tal moletom. Não estava lá, nem em nenhum lugar da casa. Gelei. À noite, meu pai chegou em casa de cara amarrada. Ao me ver, tirou da pasta de trabalho o moletom. E me disse: “Eu não me importo que tu não te agasalhes. Mas, nesta casa, nesta família, ninguém mente. Ponto. Tá claro?”. Sim, claríssimo. Esse foi apenas um episódio mais memorável de algo que foi o leitmotiv da minha formação familiar. Meu pai era um obcecado por retidão, palavra, ética, pontualidade, honestidade, código de conduta, escala de valores, menschkeit (firmeza de caráter, decência fundamental, em iídiche) e outros termos que eram repetitiva e exaustivamente martelados na minha cabeça. Deu certo. Quer dizer, não sei. No Brasil atual, eu me sinto deslocado.
Até hoje chego pontualmente aos meus compromissos, e na maioria das vezes fico esperando por interlocutores que se atrasam e nem se desculpam (quinze minutos parece constituir uma “margem de erro” tolerável). Até hoje acredito quando um prestador de serviço promete entregar o trabalho em uma data, apenas para ficar exasperado pelo seu atraso, “veja bem”, “imprevistos acontecem” etc. Fico revoltado sempre que pego um táxi em cidade que não conheço e o motorista tenta me roubar. Detesto os colegas de trabalho que fazem corpo mole, que arranjam um jeitinho de fazer menos que o devido. Tenho cada vez menos visitado escolas públicas, porque não suporto mais ver professores e diretores tratando alunos como estorvos que devem ser controlados. Isso sem falar nas quase úlceras que me surgem ao ler o noticiário e saber que entre os governantes viceja um grupo de imorais que roubam com criatividade e desfaçatez.
Sócrates, via Platão (A República, Livro IX), defende que o homem que pratica o mal é o mais infeliz e escravizado de todos, pois está em conflito interno, em desarmonia consigo mesmo, perenemente acossado e paralisado por medos, remorsos e apetites incontroláveis, tendo uma existência desprezível, para sempre amarrado a alguém (sua própria consciência!) onisciente que o condena. Com o devido respeito ao filósofo de Atenas, nesse caso acredito que ele foi excessivamente otimista. Hannah Arendt me parece ter chegado mais perto da compreensão da perversidade humana ao notar, nos ensaios reunidos no livro Responsabilidade e Julgamento, que esse desconforto interior do “pecador” pressupõe um diálogo interno, de cada pessoa com a sua consciência, que na verdade não ocorre com a frequência desejada por Sócrates. Escreve ela: “Tenho certeza de que os maiores males que conhecemos não se devem àquele que tem de confrontar-se consigo mesmo de novo, e cuja maldição é não poder esquecer. Os maiores malfeitores são aqueles que não se lembram porque nunca pensaram na questão”. E, para aqueles que cometem o mal em uma escala menor e o confrontam, Arendt relembra Kant, que sabia que “o desprezo por si próprio, ou melhor, o medo de ter de desprezar a si próprio, muitas vezes não funcionava, e a sua explicação era que o homem pode mentir para si mesmo”. Todo corrupto ou sonegador tem uma explicação, uma lógica para os seus atos, algo que justifique o porquê de uma determinada lei dever se aplicar a todos, sempre, mas não a ele(a), ou pelo menos não naquele momento em que está cometendo o seu delito.
Cai por terra, assim, um dos poucos consolos das pessoas honestas: “Ah, mas pelo menos eu durmo tranquilo”. Os escroques também! Se eles tivessem dramas de consciência, se travassem um diálogo verdadeiro consigo e seu travesseiro, ou não teriam optado por sua “carreira” ou já teriam se suicidado. Esse diálogo consigo mesmo é fruto do que Freud chamou de superego: seguimos um comportamento moral porque ele nos foi inculcado por nossos pais, e renegá-lo seria correr o risco da perda do amor paterno.
Na minha visão, só existem, assim, dois cenários em que é objetivamente melhor ser ético do que não. O primeiro é se você é uma pessoa religiosa e acredita que os pecados deste mundo serão punidos no próximo. Não é o meu caso. O segundo é se você vive em uma sociedade ética em que os desvios de comportamento são punidos pela coletividade, quer na forma de sanções penais, quer na forma do ostracismo social. O que não é o caso do Brasil. Não se sabe se De Gaulle disse ou não a frase, mas ela é verdadeira: o Brasil não é um país sério.
Assim é que, criando filhos brasileiros morando no Brasil, estou às voltas com um deprimente dilema. Acredito que o papel de um pai é preparar o seu filho para a vida. Essa é a nossa responsabilidade: dar a nossos filhos os instrumentos para que naveguem, com segurança e destreza, pelas dificuldades do mundo real. E acredito que a ética e a honestidade são valores axiomáticos, inquestionáveis. Eis aí o dilema: será que o melhor que poderia fazer para preparar meus filhos para viver no Brasil seria não aprisioná-los na cela da consciência, do diálogo consigo mesmos, da preocupação com a integridade? Tenho certeza de que nunca chegaria a ponto de incentivá-los a serem escroques, mas poderia, como pai, simplesmente ser mais omisso quanto a essas questões. Tolerar algumas mentiras, não me importar com atrasos, não insistir para que não colem na escola, não instruir para que devolvam o troco recebido a mais...
Tenho pensado bastante sobre isso ultimamente. Simplesmente o fato de pensar a respeito, e de viver em um país em que existe um dilema entre o ensino da ética e o bom exercício da paternidade, já é causa para tristeza. Em última análise, decidi dar a meus filhos a mesma educação que recebi de meu pai. Não porque ache que eles serão mais felizes assim - pelo contrário -, nem porque acredite que, no fim, o bem compensa. Mas sim porque, em primeiro lugar, não conseguiria conviver comigo mesmo, e com a memória de meu pai, se criasse meus filhos para serem pessoas do tipo que ele me ensinou a desprezar. E, segundo, tentando um esboço de resposta mais lógica, porque sociedades e culturas mudam. Muitos dos países hoje desenvolvidos e honestos eram antros de corrupção e sordidez 100 anos atrás. Um dia o Brasil há de seguir o mesmo caminho, e aí a retidão que espero inculcar em meus filhos (e meus filhos em seus filhos) há de ser uma vantagem, e não um fardo. Oxalá. 

Veja Educação. 14/09/2013.

Ioschpe participa de algumas das mais importantes organizações não-governamentais brasileiras ligadas à área da educação. É membro fundador do Compromisso Todos pela Educação e membro dos Conselhos do Instituto Ayrton Senna3 , Instituto Ecofuturo (Grupo Suzano), Fundação Iochpe e Fundação Padre Anchieta, mantenedora da TV Cultura. Como palestrante, atua no Brasil e no exterior, já tendo proferido palestras em outros países da América Latina e na sede da Unesco, em Paris. 

domingo, 27 de julho de 2014

Experiência da emoção


Primeiro dia de aula: eu, a professora, suando bicas na sala apertada da escola. Não podia me esquecer que tinha me preparado muito para aquele dia. Giz na mão, apagador de prontidão, tento desenhar alguns “rabiscos” na lousa para exemplificar a lição que deveria ser estudada naquele bimestre. Sentia uma excitação naquele momento ,mas, será que os alunos iriam gostar da aula?? Será que iriam se identificar , e pensando mais além, ficariam felizes por estar ali??
Tento não me deixar levar pelas emoções e começo a desenhar... Lembrando das cores que o homem primitivo usava para desenhar na parede das cavernas: vermelho, amarelo... Em vez do preto uso o branco. O desenho acontece tranquilamente, prontamente indicado na superfície lisa da lousa. Os alunos começam a se agitar e, então, descubro que eles não têm lápis. Ainda suando muito, corro na secretaria da escola e consigo uma caixa cheia de lápis, todos muito usados. Coloco em cima da mesa e me volto à lousa para continuar “ meus desenhos rupestres”. De repente, outro burburinho - um garoto me conta que os lápis estão sem pontas. Peço, agora um pouco nervosa, que peguem a caixa e apontem seus lápis - escuto então a caixa cair ao chão e os lápis se esparramando pela sala; não ligo, acredito que os alunos estão tentando me provocar, pois, perceberam que eu estava nervosa. Apago novamente os desenhos, peço que os alunos copiem e começo tudo do “zero” - os alunos reclamam. Por alguns instantes, deixo-me levar por aqueles símbolos oníricos e tento entender porque os antigos os desenhavam... Provavelmente queriam dizer algo: - Será que queriam expressar suas emoções?? Não, não foi isso que aprendemos na universidade. Ufa! Não consigo mais enxergar a sala, estou vidrada nos desenhos, porém, fico feliz quando olho e vejo uma garota desenhando em seu caderno. Enquanto isso, continuo a colorir os contornos na lousa, afinal, assim eram as pinturas rupestres. Depois de alguns minutos, percebo que a classe não olha mais para mim... desvio meu olhar como que numa tentativa de retomada orgulhosa e resolvo virar para trás. Fico perplexa! Todas as paredes da sala estão desenhadas e rabiscadas, símbolos estranhos, tais como garatujas, marcas e mapas.Rabiscos de todos os tamanhos. Olho para o chão e vejo vários lápis espalhados, um “canetão” e um batom _ os contornos muito fixos, marcados contra a textura da parede. Ainda perplexa com o ocorrido, escuto a voz do garoto dizendo: - Professora, agora entendi o que significa a Arte Rupestre!!!! Emoção da experiência ...

Texto de uma amiga/Educadora dedicada, comprometida e apaixonada pela arte de ensinar/aprender.

domingo, 20 de abril de 2014

Você é um professor eficaz ou eficiente?


            Está aí uma resposta difícil e por isso convido o leitor a pensar comigo e tirar suas próprias conclusões.  Vamos começar nossa reflexão com a definição de ambos os termos:  Eficaz / Eficiente.
            Segundo Paulo Krieser, mestrando em Administração de Empresas pela USP e Graduado em Ciência da Computação pela UFRGS:  “Para fins de analogia e exemplificação, podemos dizer que a eficiência é cavar, com perfeição técnica, um poço artesiano; eficácia é encontrar a água.”
            Transferindo a definição para o nosso tema, sobre o professor em si, inicio pensando no professor “certinho” e naquele que de fato funciona, ensina, desenvolve, marca a vida do aluno.  Entretanto, não se engane!  Um não exclui o outro, evidentemente!  Tem sido em torno de 30 anos de experiência em contato com a educação de crianças e jovens e, nessa caminhada, tenho encontrado ambos: os professores eficientes e os eficazes sendo que, infelizmente muitos ineficientes e ineficazes. 
            O professor eficiente é o que segue todas as regras da escola, o programa a ele conferido, faz a chamada, revisa conteúdos, elabora boas atividades, enfim, cumpre de forma eficiente todas as suas atribuições. 
            O professor eficaz é o que consegue resultados efetivos!  É o que se importa com a aprendizagem e bem estar de seus alunos.  Seguem alguns exemplos para facilitar o entendimento:
            Professor eficiente:  recebe um programa, lê, planeja a aula.  Segue rigorosamente os passos de sua aula.  Planeja e aplica avaliações, cumpre com prazos.  Usa o mesmo planejamento e técnicas para todas as turmas.  Canta músicas, lê histórias, realiza experimentos ou o que for relativo à idade e programa de sua turma.  Mantém sua sala em ordem, atende às expectativas da Direção Pedagógica.  Deixa a escola e recomeça o ciclo.  O professor eficiente transmite conhecimento e seus alunos aprendem (ou não). 
            Professor eficaz:  recebe o mesmo programa, estuda, analisa, imagina sua sala de aula, preocupa-se em como fazer, que estratégias usar para envolver seus alunos com aquele conteúdo.  Preocupa-se com os alunos que prontamente atendem às expectativas e, principalmente, com os que certamente terão dificuldades.  Ele tem o “passo a passo” de sua rotina escolar, mas ao planejar adéqua esses passos ao tempo de concentração da classe, à realidade diferente de cada turma.  Auto avalia-se a todo instante, bem como a seus alunos.  Checa se as estratégias estão de acordo, se o programa em si aplica-se para cada realidade, se os alunos respondem ao novo aprendizado.  Mantém registros de sua própria observação.  Olha para os alunos como seres individuais, percebe reações de cada um de do grupo.  Sua sala de aula é mantida de forma apropriada para a aprendizagem, tanto em relação ao apelo visual quanto aos materiais a serem manipulados e utilizados para enriquecimento da turma.  Diverte-se ao ler histórias, cantar músicas, sempre dá um brilho a mais para os olhos curiosos de seus alunos em experimentos, envolve a todos com o prazer pela conquista do aprendizado.  Também cumpre prazos, vai além das expectativas da Direção Pedagógica.  Deixa a escola revivendo cada minuto, avalia-se novamente, programa-se para o próximo dia, estuda a matéria, prepara-se, preocupa-se e elabora estratégias para certificar-se de estar atingindo a todos os seus alunos.  Acima de tudo, o professor eficaz provoca a curiosidade dos alunos!  O professor eficaz acompanha resultados aula a aula.  Participa da construção, observa o desenvolvimento, o funcionamento da construção do conhecimento!
            Resumindo, “eficiência não comprova eficácia” (Jim Leary).  Ou seja, o professor eficiente dá a aula, não necessariamente atinge os objetivos a ele conferidos.  O professor eficaz é o que atinge objetivos ou, ao menos, faz tudo o que estiver ao seu alcance para atingi-los.  Muda estratégias, pesquisa, vai além de seu próprio conhecimento, não se conforma com a horrível frase popular “eu finjo que ensino e eles fingem que aprendem”.  Em suma, “Eficácia é comprovada pelo alcance do aluno em sua aprendizagem e não pela eficiência do professor” (Jim Leary).
            Qual é a diferença entre eles?  Um é eficiente e o outro é eficaz.  Um é professor e o outro é educador, respectivamente.  Conforme Rubem Alves,  a diferença entre professor e educador é definida entre um e outro em seu livro “Conversa com quem gosta de ensinar”. Neste livro Rubem Alves enfatiza: “professor é profissão, não é algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao contrário, não é profissão; é vocação. E toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança.” Professor, segundo o autor, são como eucaliptos plantados por um motivo, enfileirado, descartável e com uma finalidade meramente comercial, econômica, trata-se de um funcionário de uma instituição submetido ao ritmo do sistema e ao tempo das máquinas. Educador por outro lado são como jequitibás, belos e raros; definidos pela suas paixões, sonhos e esperanças. O mundo mudou: jequitibás foram ao chão e em seu lugar foram plantados eucaliptos. Educadores deixaram de existir, em seu lugar professores. 
            Não quero concordar com Rubem Alvez quando diz que Educadores deixaram de existir.  Quero e preciso, como Educadora, acreditar que os Educadores estão todos aí, esperando pelo grande momento em que irão despertar seus alunos para a imensa responsabilidade e alegria de compartilhar, provocar, assistir a construção da sociedade!  Nota importante:  muitas vezes esse momento da transformação de professor eficiente para eficaz depende de uma Coordenação ou Direção Pedagógica eficaz!


segunda-feira, 10 de junho de 2013

Mundo perfeito para os filhos

                Antigamente dizia-se “criar o filho em bola de cristal” como uma referência à super proteção.  Passados os anos, vejo que a bola de cristal vem hoje com um mundo perfeito dentro dela.  Ou seja, não só temos crianças super protegidas como, pior do que isso, criadas dentro de um mundo perfeito – e, obviamente, irreal!
                
Quero aqui falar um pouco sobre isso e levar o leitor a refletir e se questionar sobre o tipo de educação e preparo para o mundo adulto que vem sendo proporcionado à criança.  Nossa responsabilidade é muito grande ao nos disponibilizarmos a ter um filho e a criá-lo para esse mundo adulto.  Os filhos são aquilo que fizermos deles!
                
A super proteção acontece em todas as áreas e às vezes é mascarada com o “cuidar bem”.  Vem junto ainda com o mundo perfeito que elaboramos em nossas mentes, já que a visão de mundo “perfeito” é diferente para cada um e todos nós sabemos que perfeição não existe.
               
Na escola, temos visto cada vez com mais freqüência pais que praticamente exigem que os amiguinhos tenham exatamente o mesmo comportamento e educação que seus filhos.  Excluem, acusam, literalmente brigam por isso.  Se tiver uma criança com necessidades especiais na classe então, é um “Deus nos acuda”, porque têm medo que o filho comece a imitar o comportamento do outro, que conviva com o diferente, como se isso fosse uma doença contagiosa. 
                
Os pais idealizam, de acordo com sua visão, um mundo perfeito onde não há disputas, ciúmes, maneiras diferentes de comportamento, etc.  Não sabem que com isso estão criando filhos fracos, inseguros, indecisos e solitários – uma vez que ninguém será, jamais, “perfeito” como eles.  Entretanto, não estamos aqui para julgarmos pais que, na verdade, erram sem saber e confundem o cuidar com o superproteger. 

Ninguém erra porque quer.  Erra sim quem conhece e não toma atitude!  Vamos então começar do começo:  Yves de La Taille, educador e psicólogo francês naturalizado brasileiro, especializado em desenvolvimento moral e professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), diz que nenhum ser humano nasce autônomo (independente).  Segundo ele, todos precisamos ser, primeiramente, heterônomos para então alcançarmos a autonomia. 

Em outras palavras, a criança, ao nascer, não tem a menor ideia de como o mundo funciona.  Ela não sabe que deve tomar banho, ou que existe um lugar na casa onde se guarda os brinquedos, que falamos bom dia ao acordar, enfim, ela nasce sem nenhuma regra, sem nenhum princípio ou regra moral ou social.  Isso é tarefa dos adultos!  São eles que estão incumbidos de contarem para as crianças como o mundo funciona.  E isso exige determinação.  Os adultos em questão são primeiramente os pais e depois os professores – e não a ordem inversa!  

Ivan Capelato, Psicoterapeuta de crianças, adolescentes e famílias; Mestre em Psicologia Clínica pela PUCCAMP, diz que “limite é o desejo de quem cuida”, de quem se importa, de quem se sente responsável pela educação da criança.  Para isso, a criança terá que passar, necessariamente, pela frustração – de desejos e vontades.  Ivan diz ainda que frustração não é sofrimento.  É crescimento!  Como ex., ele fala de uma criança que está desenhando e a ponta do lápis quebra e ela fica brava, chora muito – obviamente, frustrada.  Vamos pensar em duas situações:  na primeira, o adulto aponta o lápis e devolve à criança.  Na segunda, simplesmente a distrai e lhe dá outro brinquedo.  Se o adulto mostrar a ela que apontando o lápis ela pode voltar a desenhar, está, na verdade, mostrando como contornar uma situação de frustração.  No segundo exemplo, esse adulto perdeu um momento valioso de educação.  Não ensinou como lidar com situações difíceis do dia-a-dia.  Ilustrando a primeira situação:  diante de qualquer incômodo, os pais simplesmente trocam de escola, de curso de natação, viram sua própria vida de ponta cabeça para satisfazer “uma simples ponta de lápis quebrada”...

“Temos, hoje em dia, jovens extremamente inteligentes mas sem nenhum auto-controle emocional” diz Ivan Capelato.  Verdadeiros gênios que, se a namorada romper com ele, a primeira coisa que vem à cabeça é suicídio, justamente por não terem nenhuma estrutura emocional bem construída.

Enquanto países desenvolvidos lidam com a inclusão de maneira respeitosa e natural (inclusão, não só de portadores de necessidades especiais, mas também inclusão de alunos em situações sócio-econômicas diferentes), vemos pais e escolas, no Brasil, selecionando cada vez mais, tentando construir grupos sociais homogêneos e irreais.  Estamos ensinando desse modo, às nossas crianças, a intolerância, a seleção, o egoísmo e a desumanidade.  Com a super proteção dentro de um mundo perfeito, criamos crianças e jovens fracos, sem determinação, sem atitude e sem nenhum preparo emocional para o mundo real.

Vamos pois, mimar menos e educar mais!  Que nossas crianças comecem a ser criadas do lado de fora da bola de cristal e do mundo perfeito, com uma visão ampla do mundo real.  Vamos lidar com as nossas próprias frustrações e passar a encará-las como oportunidades de crescimento – inclusive para nós mesmos!

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O maestro



                A escola, assim como a orquestra, precisa do maestro.  Os músicos dependem dele, a platéia espera o resultado positivo e agradável do seu trabalho.  Sendo assim, como deveria o maestro da escola se preparar para a regência de sua orquestra?  E os músicos?  A platéia, de modo que possa apreciar a performance?   Há que se ter disciplina e determinação para estudar, graduar, estudar  mais e mais e praticar.  Não basta obter uma graduação para garantir uma performance de qualidade. 
                Na escola, o maestro é o Diretor e/ou Coordenador Pedagógico.  Os músicos são os professores, assistentes e todos que formam a equipe.  A música são os alunos.  A platéia são os pais.  Para que a música seja de qualidade, os músicos precisam estar em perfeita harmonia, regidos pelo maestro preparado para a função.  Desse modo, a platéia terá o maior prazer em apreciar o resultado.
                Analogias à parte detenho-me agora na questão da relação e responsabilidades do Diretor da escola.  A formação é a Pedagogia.  É o básico necessário – por lei e por fundamentação e preparo teórico básico.  Sim, básico, porque a formação não garante a eficácia.  Esta vem com a experiência, prática de sala de aula, estudos por meio de especializações que vêm com a pós-graduação, empenho, dedicação, firmeza no estabelecimento e cumprimento de objetivos – específicos e gerais.
                Cabe ao Diretor estar presente em todos os momentos da escola, seja na observação de aulas e de alunos tanto durante as aulas quanto nos horários de intervalo e passeios.  É o Diretor quem observa, avalia, orienta e checa o trabalho do professor, desde o planejamento de atividades até a execução em sala de aula e sistemas de avaliação – cognitiva, social, emocional.  É ele quem detecta possíveis problemas entre alunos e age.  É o Diretor experiente que trabalha na prevenção de problemas.  É o Diretor quem garante a sintonia do trabalho entre professor e assistente de classe.  É ele quem garante que todos os momentos da escola sejam assistidos. 
                O Diretor da escola é aquele que tem muito claro o objetivo geral final.  Ele tem a visão do todo e, por isso, trabalha no sentido de não se desviar de sua meta.  Ele sabe qual é o caminho a ser trilhado e não se desvia dele.  Evidentemente, durante o percurso, muitas vezes ele terá que tomar certas decisões momentâneas, mas sem jamais perder de vista o “ponto final”.   Se algo não vai bem, ele detecta e age!
                Não acredito no Diretor que dirige a escola de sua sala.  Também não acredito no Diretor que acumula outras funções.  Foco é o segredo!  Acredito e admiro o Diretor que vai à sala de aula, que se reúne constantemente com sua equipe, que planeja junto, que se faz presente junto a todos os envolvidos.  Admiro o Diretor que mantém a escola em uma constante, sem altos e baixos, firme e forte – sempre!   É o Diretor da escola que mantém os pais atualizados e muito bem informados sobre a vida escolar de seus filhos.  As habilidades fundamentais, portanto, são disciplina, organização, firmeza e liderança.  A simples graduação não significa nada se não colocarmos essas habilidades no pacote.
                Trabalho solitário, o do Diretor da escola.  Apesar da analogia com o maestro, o diretor trabalha praticamente no camarim, não sendo, na maioria das vezes, reconhecido.  Os créditos frequentemente são atribuídos ao resultado final e não ao trabalho de fundo, de sustentação, de base do Diretor.  Entretanto, se algo der errado, ele é prontamente lembrado...
                Reconhecimento?  É a satisfação própria da consciência de ter feito um bom trabalho.  É saber somente para si mesmo que trabalhou firme, incansavelmente, no cumprimento de seus objetivos.   Para o Diretor equilibrado, maduro e consciente, o que realmente importa é a música final, na apresentação.  Ou seja, é ter o prazer inigualável de ter garantido uma educação de qualidade aos seus pupilos, é a satisfação por ter contribuído com o desenvolvimento social, emocional e cognitivo dos alunos sob sua batuta!  É também o prazer de presenciar a satisfação da platéia!

terça-feira, 9 de outubro de 2012

O coração da escola



Coordenador Pedagógico, aqui chamado de “o coração da escola”.  Muitos irão pensar que estou “puxando brasa para a minha sardinha” e, de fato, estou mesmo, mas espero poder discorrer sobre o assunto de forma a fazer com que o leitor compreenda a expressão que pode ser tomada como um tanto arrogante.
Um pouco da minha história, para situar o leitor e organizar o pensamento:  estou na profissão há 30 anos.  Sou graduada em Pedagogia e, na época, a especialização do curso era Orientação Educacional ou Administração Escolar.  Optei por Orientação Educacional, apesar de, anos mais tarde, ter feito também Administração, assim como pós-graduação em Psicopedagogia e em Didática do Ensino Superior.  Pois bem, tenho para mim muito claras cada uma das diferentes funções:  orientação educacional e administração escolar.  Aí entra o Coordenador Pedagógico, uma função pouco clara, tanto para os donos das escolas e governo quanto para os pais e até mesmo para os próprios profissionais. 
O Coordenador Pedagógico é aquele que dá o tom à escola; ou seja, acompanha, orienta, interfere, avalia o trabalho docente através de participação efetiva diária na escola, seja através de reuniões individuais com os professores, ou por disciplina, série, projetos interdisciplinares, etc.  É também aquele que acompanha o desenvolvimento dos alunos através de observação presencial nas aulas, resultados estatísticos de rendimento, observações de casos individuais que necessitem de atenção redobrada, além da observação dos alunos enquanto grupo de trabalho e/ou de diversão – a hora do intervalo é excelente para observação e análise!
É o Coordenador Pedagógico que tem a visão do todo e, assim, orienta a equipe nesta ou naquela direção, ou se é o momento de mudar o rumo.  É ele quem atende aos pais e está apto a sanar dúvidas, a estabelecer parcerias com as famílias, inclusive orientando quanto ao relacionamento adequado que solidifique a parceria família/escola.
Além disso, é o Coordenador que administra eventos da escola – é ele quem decide, em conjunto com o grupo de professores quais são os eventos de relevância pedagógica, quais deverão ser internos e quais deverão ser abertos às famílias, como e quando serão as festividades, quem serão os responsáveis, etc. 
Administra também os conflitos – tanto entre alunos como entre professores!  Ele, o Coordenador, é o responsável pela imagem da escola e pelo bom andamento da mesma.  É ele quem se coloca aberto e à disposição dos pais, quem garante que as informações cheguem às famílias a contento.  É ele ainda que planeja e providencia cursos de extensão e aperfeiçoamento para a equipe docente.  Incorporando as funções do Orientador Educacional, é o Coordenador quem observa alunos com diferenças de comportamento e/ou possíveis distúrbios de aprendizagem avaliando a necessidade de orientar o professor a lidar com a situação e, caso seja necessário, de chamar a família para que também seja notificada, orientada e, em havendo necessidade, encaminhar para profissionais especializados.  Escola não é consultório.  A função é de orientar e encaminhar, se for o caso.  A escola não pode se omitir, mas deve estar também atenta para não ultrapassar seus próprios limites. 
Para tudo isso e muito mais, não basta ser simplesmente graduado em Pedagogia.  É necessário ter experiência de sala de aula e cursos de aperfeiçoamento específicos para a função.  O Coordenador Pedagógico precisa saber para poder orientar/coordenar.  Precisa saber planejar a curto e a longo prazo, precisa de conhecimento profundo em técnicas metodológicas e de avaliação, assim como estratégias práticas de ensino, liderança e coordenação de grupo – seja grupo de alunos, pais, ou professores – e, finalmente, embasamento teórico que suporte todas as suas ações.
O Coordenador Pedagógico não é (ou não deveria ser) simultaneamente “Diretor da Escola” ou Psicólogo Educacional.  E é isso exatamente que ocorre na imensa maioria das escolas:  acúmulo de funções – e nenhuma delas acaba sendo desenvolvida exatamente como deveria.  O Coordenador Pedagógico não é simplesmente um professor que demonstra certa liderança e que de repente assume uma escola inteira!
Na verdade, já adaptei um pouco as funções acima descritas, quando inseri algumas funções do Orientador Educacional às funções de Coordenador Pedagógico.  Já basta, é suficiente para um trabalho bem feito.
O Coordenador Pedagógico não é o Administrador da escola, não é o Diretor.  E nem o Secretário.  Não é ele quem se preocupa com as questões financeiras ou reuniões burocráticas com Departamentos de Ensino.  Ele trabalha atrás do palco!  Ele é o coração da escola e, para tanto, precisa se concentrar, focar em suas atribuições e SER RECONHECIDO, VALORIZADO – inclusive financeiramente.  É a figura da qual uma escola inteira depende e que, sem ele, sem o “coração”, a escola passa a funcionar mecanicamente, como se fosse respiração artificial.

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